Faxineiro em Aracaju. Pedreiro em São Paulo. Adilson Rodrigues se transformou no pugilista mais carismático do boxe brasileiro. Simples e espontâneo, Maguila – apelido que ganhou dos amigos de obra pela semelhança com o personagem de um desenho famoso – ganhou espaço na mídia e fez de suas lutas um evento imperdível aos domingos. O eterno campeão peso pesado morreu nesta quinta-feira, em São Paulo, aos 66 anos. Ele sofria de encefalopatia traumática crônica e estava internado há 28 dias. Desde 2010, o ex-atleta lutava contra o Alzheimer.
Maguila chegou a São Paulo em 1970, juntamente com o irmão Maurício. Assustou-se com o frio da cidade e foi trabalhar como pedreiro. Chegou a morar em uma boleia de caminhão, foi preso por dez horas por agredir um companheiro de trabalho, se fez de louco para não servir o Exército e entrou no boxe aos 22 anos pelas mãos de Ralph Zumbano, tio de Eder Jofre, na academia do extinto BCN.
“Quanto você pesa, meninão?”, perguntou Ralph, um dos lutadores mais clássicos que o Brasil já teve. “Noventa e cinco”, disse Maguila. Ralph se animou, pois poucos são os lutadores nacionais na principal categoria do boxe.
Em pouco tempo, Maguila foi campeão do tradicional torneio Forja dos Campeões e do Campeonato Paulista. Em 1983, aos 25 anos, passou para profissional e com apenas três lutas já era campeão nacional. Mais seis combates, já sob a orientação da empresa do narrador Luciano do Valle, veio o cinturão sul-americano.
Maguila virou uma febre nacional. Suas lutas levantavam a audiência da TV Bandeirantes, onde Luciano do Valle trabalhava. Mas o ano de 1985 foi complicado para o pugilista. Duas derrotas acachapantes para o argentino Daniel Falconi e para o holandês Andre Van Oetelaar, ambas por nocaute, quase encerraram sua carreira. Ralph foi demitido e em seu lugar foi contratado Miguel de Oliveira, que na época dividia com o lendário Eder Jofre a glória de ter sido campeão mundial pelo Brasil.
Com Miguel de Oliveira no córner, Maguila devolveu a Falconi e Oetelaar a derrota na mesma moeda e transformou em ídolo nacional. O foco de Luciano do Valle e de sua empresa, a Luqui, virou para o supercampeão Mike Tyson. Contatos foram feitos com Don King, que cuidava dos interesses do fenômeno norte-americano. Até uma luta no Maracanã foi sonhada.
Com isso, os desafios foram ficando maiores. O primeiro foi a conquista do título das Américas, com mais de 10 mil torcedores no Ginásio do Corinthians, em São Paulo. Maguila passou pelo resistente norte-americano Rocky Sekorsky, em 12 rounds.
Mais de 20 mil pessoas lotaram o Ginásio do Ibirapuera, em 1987, para a luta contra o ex-campeão mundial James “Quebra-Ossos” Smith. Em decisão polêmica, por pontos, o brasileiro foi proclamado vencedor. O triunfo o colocou entre os dez primeiros do ranking do Conselho Mundial de Boxe e virtual desafiante de Tyson.
O ano de 1988 foi de espera pela oportunidade de tentar o título mundial. Como ela não veio, Maguila, segundo colocado no ranking, enfrentou Evander Holyfield, que era o primeiro. No duelo de Lake Tahoe, o brasileiro, treinado pelo lendário norte-americano Angelo Dundee, que havia trabalhado com Muhammad Ali e Sugar Ray Leonard, chegou a vencer o primeiro round para dois dos três jurados, mas foi aniquilado no segundo. “O Dundee me orientou errado. Mandou eu ir para cima dele (Holyfield)”, reclamou Maguila.
A partir daí, a empresa Luqui quis encerrar a carreira de Maguila, que não aceitou e chegou a enfrentar o mito George Foreman, em 1990. Sofreu, então, mais um nocaute violento no segundo round. “Tomei um soco que quase venho para o Brasil sem pagar passagem”, brincou ele, ao comentar sobre a força do rival norte-americano, que tinha 41 anos na época.
Depois de Foreman, Maguila lutou mais dez anos. Fez uma peregrinação pela América do Sul, acumulou dinheiro, manteve o interesse do público, mas nunca mais foi o mesmo. Chegou a ganhar o inexpressivo título mundial da Federação Mundial de Boxe, quando derrotou o britânico Johnny Nelson. Aliás, bateu este adversário também na revanche.
Em 2000, aos 42 anos, pendurou as luvas. Mas se manteve em evidência. Fez comerciais de TV, participou de programas de auditório e gravou CD de pagode. Com sua morte, o boxe perde um personagem único.
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