(FOLHAPRESS) – A longevidade da carreira de Alcione, que já passa das cinco décadas, pode ser explicada por sua capacidade de reinventar o lugar do samba na música brasileira. A cantora este ano já foi homenageada pela Mangueira, no Carnaval do Rio de Janeiro, cantou ao lado de Ludmilla a vinheta da Globeleza e ainda interpreta com ela a música tema da próxima novela das sete. Agora será também homenageada pela edição de 40 anos do Rock in Rio.
O que poderia ser atribuído ao seu talento, Alcione credita à sorte. “Lido com isso com muito agradecimento a Deus, porque a essa altura do campeonato as pessoas ainda lembram toda a minha trajetória e procuram me homenagear.”
Ao longo de 50 anos, a artista não se amparou apenas em sua voz marcante, mas buscou se renovar. Além da recente turnê de celebração da sua carreira e das parcerias com Ludmilla, a cantora também se rendeu ao funk. Um dos seus maiores sucessos, “Você Me Vira a Cabeça”, se tornou um MTG do DJ Davi Kneip este ano. O subgênero viralizou nas redes ao “colar” sons ou músicas com novas batidas e efeitos sonoros. A montagem fez a geração Z conhecer uma canção que virou um hit após fazer parte da trilha de “Da Cor do Pecado”, novela de 2004.
Alcione também é uma figura marcante nas redes sociais por outros motivos. Desde 2016, ela se tornou um meme por improvisar a letra da música “Evidências”, ao lado de Chitãozinho, no Domingão do Faustão. Na ocasião, ela soltou um “badauêra, badauêra” para acompanhar o sertanejo. O vídeo de 40 segundos é frequentemente ressuscitado na internet.
Sua música “A Loba”, por sua vez, é uma das responsáveis pelo termo que passou a designar mulheres com personalidade forte, maduras, sem medo de expressar suas opiniões e desejos. Para os mais jovens, Alcione também se tornou sinônimo de monogamia em razão de frases da mesma canção que dizem “não divido você com ninguém” e “quando estou amando, eu sou mulher de um homem só”. Outra de suas músicas, “Ou Ela ou Eu”, também reflete esse lado monogâmico.
“Acho isso muito natural e eu fico feliz com isso. Na certeza que os jovens me notam, que eles querem falar alguma coisa sobre mim. Isso é uma coisa pela qual sou muito agradecida”, diz.
Esse reconhecimento vai além das redes sociais. No ano passado, Alcione foi imortalizada pela Academia Brasileira de Cultura e, de lá para cá, se apresentou em festivais como Afropunk, Psica e Turá. Agora, ela se prepara para dois shows no Rock in Rio, nos dias 21 e 22 de setembro, onde será homenageada pela Orquestra Sinfônica Brasileira e por artistas como Diogo Nogueira, Mart’nália, Majur, Péricles e Maria Rita, além da bailarina Ingrid Silva.
“Gosto muito de me encontrar com os sambistas mais jovens, sabe? E todos eles, que vão cantar comigo, têm um sentimento e um pensamento que me atraem muito.”
Estar no Rock in Rio é simbólico para alguém que construiu sua carreira em terras cariocas, apesar de ser maranhense. Alcione saiu de sua terra natal ainda nos anos 1960 para tentar viver de música no Sudeste. “Bati muita perna por esse Brasil, com meu disco debaixo do braço, para as pessoas me conhecerem, conhecerem a música que eu cantava, minha maneira de pensar, meu comportamento.”
Apesar disso, ela nunca escondeu suas origens. “Sempre falei do Maranhão nas minhas histórias. Nunca esqueci minha terra. Então, quando as pessoas me olham, elas veem também o Maranhão, porque sempre fiz questão de frisar que sou de lá.”
Vinda do Nordeste e determinada a conquistar seu espaço na cena musical brasileira, a artista começou sua jornada cantando em casas noturnas da zona sul carioca. O reconhecimento nacional chegou com o lançamento do álbum “A Voz do Samba”, em 1975, que apresentou o icônico hit “Não Deixe o Samba Morrer”.
Esse sucesso não só solidificou sua posição no cenário musical, mas também a destacou como uma das grandes vozes do samba. Seu trabalho a levou a integrar a fundação do Clube do Samba, junto a nomes como João Nogueira e Clara Nunes, formando uma elite musical que moldou o samba moderno.
A relação da cantora com a Mangueira também foi crucial para sua trajetória. Desde sua primeira participação no desfile, em 1979, até a fundação da Mangueira do Amanhã -escola mirim que forma talentos no samba e ajuda crianças na educação escolar-, em 1987, Alcione tem sido uma figura central na escola de samba. Sua ligação com a agremiação começou quando conheceu Bira, ex-presidente e relações públicas da escola, que a apresentou à comunidade verde e rosa.
Esse vínculo se fortaleceu ainda mais no último Carnaval, quando Alcione foi enredo da escola. “Tenho um amor imenso pela Mangueira, que sempre foi a minha escola de samba. Foi um privilégio ser homenageada por uma escola como esta, porque ninguém sabe quem ganhou o Carnaval antes da Mangueira passar.”
Com o mote “A Voz Negra do Amanhã”, a Mangueira anunciava que o samba de Alcione nunca morre.
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